segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Trafigura e a Máfia Presidencia Por Rafael Marques de Morais


Em dois anos de operações em Angola, a Pumangol tornou-se no mais influente intermediário na venda de petróleo angolano, assim como na distribuição de combustíveis no país.


Esta empresa é uma sociedade de capitais mistos, entre a multinacional Puma Energy, uma subsidiária da empresa suíça Trafigura, e a sua parceira angolana, Cochan S.A.
Em Agosto de 2010, o Presidente José Eduardo dos Santos promulgou cinco contratos de investimento avaliados em US $931 milhões, pela multinacional Puma Energy e a Cochan S.A. Esses contratos incluem também a Pumangol.
Num país classificado entre os 15 piores do mundo para se fazer negócio, o sucesso fulgurante da Trafigura e da Pumangol merece aprofundada investigação sobre as relações desta empresa com o círculo presidencial.
A multinacional suíça, baseada em Genebra, beneficia de um contrato de permuta com a Sonangol. A Trafigura recebe petróleo, em quantidades não divulgadas publicamente, em troca do envio de derivados de petróleo para o consumo doméstico em Angola. Aparentemente, a Trafigura vende a maioria do petróleo à empresa estatal chinesa Sinopec.
Uma investigação, realizada em Setembro passado, pela revista internacional Energy Compass apurou que o contrato entre a Trafigura e a Sonangol teve início em 2009. Em 2011, o contrato foi avaliado em US $3.3 biliões, com base em 3.25 milhões de toneladas métricas de derivados de petróleo importados por Angola. O contrato é gerido pela DTS Refining, uma subsidiária da DTS Holdings, também conhecida por DT Group. Esse grupo foi criado em 2008 e está baseado em Singapura.
O general Leopoldino Fragoso do Nascimento, conselheiro principal do ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, general Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa,“ é um dos administradores actuais do DT Group, de acordo com a documentação oficial mais recente registada em Singapura, examinada por Maka Angola.
Entre os administradores do referido grupo encontram-se também Claude Dauphin, um dos fundadores da Trafigura, e o brasileiro Mariano Marcondes Ferraz, considerado como o ponta-de- lança da Trafigura em Angola. Foi este último quem assinou os acordos com o executivo angolano, no valor de quase um bilião de dólares. A empresa tem mais dois administradores, nomeadamente Patrick Waters, um cidadão britânico actualmente residente em Singapura, e Juliana Loh Joo Hui, de Singapura.
A DTS Holdings é uma empresa de capitais mistos entre a Trafigura PTE (Singapore) e a Cochan Limited (Singapura). O general Leopoldino Fragoso do Nascimento também é administrador da Cochan, assim como Juliana Loh Joo Hui e ainda Johan David Berman, também de Singapura. O único accionista da Cochan Limited é a Cochan Ltd (Bahamas).
No entanto, há uma terceira Cochan, a Cochan S.A., criada em Angola a 6 de Abril de 2009. Nos contratos promulgados pelo Presidente José Eduardo dos Santos, a Cochan S.A detém 51 porcento das acções na sociedade Pumangol, enquanto a DTS Holdings, na qualidade de investidor estrangeiro, detém 49 porcento. Mas, a DTS Holdings não é assim tão estrangeira porquanto o seu administrador é o conselheiro presidencial general Leopoldino Fragoso do Nascimento.
Mas, para melhor entendimento desta teia de interesses, é imperativo indicar os accionistas nominais da Cochan S.A. Estes são Zandre Eudénio de Campos Finda, Augusto Mondlane de Campos Finda, António Carlos de Oliveira, Telma Marina Alves Pedro Gomes e Eden Zerá de Carvalho Albuquerque.
Quem são esses indivíduos?
Zandre Eudénio de Campos Finda é o administrador-executivo formal da Nazaki Oil & Gas, uma empresa petrolífera cujos proprietários são o actual vice-presidente, Manuel Vicente, e os generais “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento, em percentagens iguais. A Nazaki é a companhia parceira da empresa norte-americana Cobalt International, que opera os blocos 9 e 21 de pré-sal. Actualmente, a Cobalt encontra-se sob investigação judicial nos Estados Unidos da América, por suspeita de violação das leis anti-corrupção, ao associar-se a dirigentes angolanos. António Carlos de Oliveira é também, formalmente, administrador não-executivo da Nazaki.
Coincidência ou não, tanto a Cochan como a Nazaki foram inicialmente estabelecidas com o mesmo endereço oficial em Luanda, na Rua Luís Mota Feo 3-2º, Apt 5, Ingombota. O triunvirato presidencial composto por Manuel Vicente, Kopelipa and Leopoldino Fragoso tem usado este mesmo endereço como a morada oficial de cerca de 40 empresas, as quais têm os seus tentáculos espalhados pela economia política angolana.
Ademais, Eudénio de Campos Zandre Finda é também o administrador-executivo da Movicel, uma das duas operadoras de telefonia móvel em Angola. Esta empresa foi privatizada em 2010. O trio presidencial recebeu, sem concurso público, 40 porcento das acções da Movicel por via de um decreto do Presidente dos Santos. A Portmill Investimentos e Telecomunicações, uma empresa por eles criada a 27 de Julho de 2007, tinha a sua sede inicialmente no mesmo endereço em Ingombota. Esta empresa tornou-se a fachada para os negócios corruptos do trio presidencial. Como testa de ferro para a participação accionista do general Leopoldino Fragoso do Nascimento e associados, Eudénio de Campos Zandre Finda também acumula o cargo da administrador-executivo do Banco Espírito Santo Angola (BESA).
Em geral, no acto de criação das empresas de fachada, os accionistas nominais assinam um documento tranferindo as acções e os benefícios integrais para os verdadeiros proprietários, por norma dirigentes governamentais no activo. No caso da Cochan S.A., esta é apenas mais uma das cerca de 40 empresas que pertencem a Manuel Vicente e os generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento.
O que requer uma investigação mais aprofundada é a origem das centenas de milhões de dólares que a DT e a Cochan têm estado a investir em Angola.
A Lei da Probidade Pública define como “acto de improbidade pública conducente ao enriquecimento ilícito” receber “vantagem económica, directa ou indirecta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou de presente de quem tenha interesse, directo ou indirecto, que possa ser atingido ou amparado por acção ou omissão decorrente das atribuições do agente public” (Art. 25, 1, a).
O general Leopoldino Fragoso do Nascimento tornou-se administrador da Cochan Singapura a 10 de Maio de 2010, na altura em que exercia o cargo de chefe de Telecomunicações da Presidência da República.
Como pessoa de confiança do Presidente José Eduardo dos Santos e seu testa de ferro em negócios privados, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento não teria assumido funções privadas no exterior sem a autorização do seu comandante-em-chefe. O general em questão continua a exercer o cargo de administrador-executivo na empresa em Singapura, acumulando estas funções com o cargo de conselheiro na presidência, sob ordens do general Kopelipa, seu superior imediato e parceiro de negócios, e com a aprovação do Presidente.
Em dois anos de operações, a subsidiária do DT Group, Pumangol, já ergueu cerca de 60 bombas de combustível no país. De acordo com a informação prestada pelo director-geral da referida empresa à imprensa local, Paul Edwards, a subsidiária tem receitas diárias estimadas em cerca de um milhão de dólares. O responsável também revela que a Pumangol compra o combustível à Sonangol, segundo notícia divulgada pelo semanário Agora, há um ano. A Pumangol é a marca nacional para a Puma Energy. Em Septembro de 2011, a Trafigura vendeu 20 porcento da Puma Energy à Sonangol Holdings. A Pumangol, uma empresa obscura, tem não menos de oito entidades subsidiárias baseadas nas Ilhas Marshall.
A influência política desta empresa pode ser também medida pela cobertura mediática das suas operações, tanto por órgãos de comunicação públicos como privados. O principal grupo privado de comunicação social, a Medianova, também pertence ao triunvirato composto por Kopelipa, Manuel Vicente e Leopoldino Fragoso. Com frequência, a inauguração de cada bomba de combustível conta com a presença das autoridades locais e de jornalistas. Os discursos de propaganda apresentam as bombas como uma mais-valia para o “desenvolvimento sócio-económico” da respectiva região.
O labirinto de ligações políticas e de negócios privados que envolvem a Sonangol, Manuel Vicente, os generais Kopelipa e Leopoldino Fragoso do Nascimento, a Trafigura, e uma míriade de empresas offshore, levanta várias questões.
Onde começa o investimento da Sonangol em tais sociedades mistas e onde acabam os interesses privados do trio presidencial?
Seguindo os modelos de investimento anteriores, em que a Sonangol é usada como modo de promover o enriquecimento pessoal dos membros do triunvirato , é de arrepiar a magnitude do saque de recursos públicos e esquemas de lavagem de dinheiro que envolvem esta empresa.
Há ainda o facto do Presidente José Eduardo dos Santos permanecer indiferente ao facto do general Leopoldino Fragoso do Nascimento exercer abertamente cargos privados em Singapura, enquanto trabalha para a presidência. Esta é a marca característica da impunidade do executivo do Presidente dos Santos, investida naqueles que lhe são próximos.
Com o contributo de Marc Guéniat, a partir da Suíça

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