quinta-feira, 12 de abril de 2012

“São os filhos dos dirigentes que lideram os protestos em Angola”, diz autor de livro sobre protestos


São Paulo – Os dois jornalistas angolanos, autores do livro “Os Meandros das Manifestações em Luanda”, acreditam que a contestação em Angola marca a transição de um “regime” que deve mudar com eleições livres e justas.
Fonte: Lusa Club-k.net
Coque Mukuta (na foto), 29 anos, e Cláudio Fortuna, 34 anos, jornalistas angolanos residentes em Luanda, acompanharam todas as manifestações de contestação contra o “regime”, que dizem estar corporizado no Presidente José Eduardo dos Santos e em pouco mais de “dez figuras” próximas do chefe de Estado, e escreveram um livro sobre os “meandros” dos protestos que pedem mudanças democráticas no país.

 “Todos os angolanos esperam eleições livres e justas porque caso isso não aconteça os manifestantes não vão deixar que as coisas fiquem assim. Os angolanos não querem que o Presidente coloque o primo ou o sobrinho no poder porque o meu país não é uma monarquia, não é a ‘casa da mãe Joana’, disse à Lusa o jornalista angolano Coque Mukuta, um dos autores do livro “Os Meandros das Manifestações em Luanda – Volume I” que pretende relatar os protestos que se verificam na capital angolana e que é apresentado na quarta-feira em São Paulo, no Brasil.

 “Angola é uma República que é de todos nós, a única riqueza que Deus nos deu foi a nossa terra. Por isso, as eleições livres e justas vão resolver o problema porque se ‘eles’ se portarem como se têm portado os manifestantes, de certeza, não vão dar tréguas e aquilo vai ser pior”, prossegue o autor.

 “Este livro aborda as vicissitudes e os pormenores sobre o que aconteceu em Angola desde 2011 quando começaram as revoltas contra o Presidente José Eduardo dos Santos que está há mais de 32 anos no poder. Nós contamos a forma como o executivo, a polícia e os elementos da segurança do Estado trataram os manifestantes até ao ponto de os tentarem corromper para ver se as coisas caíam em saco roto. Mas os manifestantes foram continuando as suas batalhas. Por isso é que nós lhe chamamos primeiro volume. Há de aparecer o segundo e terceiro em função das revoltas da batalha”, explicou Mukuta.

 “O que nós conseguimos abordar neste livro foi a injustiça de um Estado que legitima uma Constituição mas que por detrás procura subverter as coisas e que corrompe as coisas. Felizmente não se vive apenas de dinheiro. No livro falamos também de todos os espancamentos desde o dia 7 de março até aos dias de hoje”, acrescenta o jornalista angolano que afirma não recear eventuais represálias pela publicação do trabalho.

 “Eu chamo-me Coque Mukuta, sou jornalista e cubro as manifestações. Vivo em Luanda na ‘5.ª Avenida’ do Cazenda. Estive preso muitas vezes em Luanda e acompanhei todas as manifestações. Estou no Brasil para apresentar o livro em São Paulo. Não estou a fazer o lançamento porque o lançamento vai ser em Angola, em Luanda, na nossa terra. É lá que eu vou fazer o lançamento”, disse Mukuta.

“Com livro ou sem livro já sou alvo de perseguição mas toda a ação tem uma reação”, afirmou o jornalista que explica que, em parte a contestação dos jovens, vem do interior do próprio regime dominado por José Eduardo dos Santos e por um grupo que se “resume a dez pessoas”.

 “No interesse da Nação, algumas pessoas começam a sair do núcleo duro para darem o seu contributo na sociedade. Uma parte dos manifestantes são filhos dos dirigentes do MPLA, cresceram no regime do José Eduardo dos Santos. Não cresceram nas matas e são os filhos dos dirigentes que lideram alguns destes grupos de protesto em Angola”, sublinha Mukutu que considera que a música de contestação foi inspiradora das manifestações, que também usaram as redes sociais para se organizarem.

“Em Angola, as músicas sempre refletiram a contestação mesmo antes da Independência. Temos mais recentemente o “Brigadeiro 10 Pacotes”, “MCK”, “Mata Fracuzx” e “Carbono” que são ‘rappers’ que contestam com as suas músicas o regime de Eduardo dos Santos mas isto tem fases e não basta a contestação através da música. É importante dar corpo às ideias que vinham nas músicas e é por isso que os jovens manifestantes se muniram de certos elementos - a lapiseira e o papel - e aproveitaram os ‘facebooks’ e as redes sociais para fazerem as propagandas dos protestos”, relata o jornalista que acompanha as manifestações desde o princípio.

 “Foi assim que começou. Aquilo está cada vez mais forte, cada vez mais evoluído e pode ser difícil de controlar. Esta contestação pode ser a transição do Presidente José Eduardo dos Santos”, conta Mukutu que, no entanto, admite que a contestação juvenil em Angola não tem lideranças, tal como aconteceu noutros pontos do continente.

 “Se aparecer uma liderança incorruptível que possa encabeçar a juventude para levar avante o grupo tudo pode acontecer tal como, possivelmente, terá acontecido noutros pontos do mundo, e estou a falar da “Primavera Árabe”, diz o jornalista angolano que “gostava” de apresentar o livro “em Portugal e em outros pontos da Lusofonia”.

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