terça-feira, 27 de março de 2012

Jovens promovem abaixo-assinado contra Governo


Em causa estão as péssimas condições em que vivem os jovens estudantes moçambicanos no exterior, que agora veio à ribalta com a manifestação pacífica dos estudantes na embaixada de Moçambique na Argélia

Maputo (Canalmoz) – Um movimento de jovens que contestam as políticas do Governo para com a juventude acaba de nascer e já está em curso a assinatura de uma carta de repúdio ao tratamento que o Governo tem dado à juventude. Trata-se de um abaixo-assinado contra o Governo de Moçambique que nasceu com a recente situação de estudantes moçambicanos na Argélia.
Recorde-se, os estudantes moçambicanos naquele país da África do norte ocuparam a semana passada a embaixada local de Moçambique, exigindo, entretanto, o pagamento do valor semestral da bolsa de estudos, porque lhes havia sido pago apenas o valor de 4 meses, contra os seis meses combinados. Reclamavam também os estudantes, a revisão em alta do valor de 150 dólares a que têm por ora direito por mês.
Ao invés de atender as preocupações dos estudantes, a missão diplomática de Moçambique na Argélia decidiu chamar a Polícia argelina para escorraçar os estudantes para fora da embaixada. E em Maputo o ministro da Educação disse que os estudantes que se manifestaram iriam perder a bolsa e imediatamente regressariam ao País.
Em Maputo, jovens indignados com este tratamento dado aos estudantes moçambicanos no exterior, decidiram se juntar, para através de uma carta abaixo-assinada, repudiar a atitude do Governo. Eis o conteúdo da carta na íntegra:

“Pela Justiça aos Estudantes Bolseiros Moçambicanos na Argélia

Nós, cidadãos moçambicanos, entre jovens e adultos, residentes no país e na diáspora, tendo tomado conhecimento da situação na qual se encontram os nossos compatriotas estudantes bolseiros na Argélia, que levantaram uma manifestação pacífica nas instalações da Embaixada de Moçambique naquele país, exigindo o pagamento reajustado, completo e atempado do valor das suas bolsas de estudo e o esclarecimento da sua condição de estudantes no estrangeiro, especificamente quanto aos seus direitos e deveres, ressalvando que a manifestação tenha resultado do esgotamento de todas as tentativas de diálogo encetadas pelos estudantes bolseiros junto à representação diplomática de Moçambique e o Instituto de Bolsas de Estudo do Ministério da Educação, através de cartas, exposições e pedidos de audiência, que não tiveram a devida resposta ou aceitação, tomando em consideração os pronunciamentos públicos de Sua Excelência o Ministro da Educação da República de Moçambique, segundo os quais alguns dos estudantes manifestantes se encontram na eminência da perda total das suas respectivas bolsas e do seu regresso imediato para o país, vimos por meio desta petição requerer a quem de direito o seguinte:

1. Que se salvaguarde o direito à manifestação dos estudantes bolseiros na Argélia, segundo o postulado no artigo 51º da Constituição da República de Moçambique;

2. Que nenhum dos estudantes manifestantes perca a sua respectiva bolsa de estudo, parcial ou totalmente, como consequência da legítima manifestação pela salvaguarda dos seus direitos;

3. Que os valores alocados ao financiamento das bolsas de estudo dos estudantes moçambicanos sejam reajustados em função do tempo actual, do custo de vida local e das suas reais necessidades logísticas.

Com efeito, as reivindicações dos estudantes moçambicanos na Argélia há muito que vêm sendo transmitidas às entidades competentes nacionais naquele país e em Moçambique, sem contudo consecutirem numa solução razoável que pudesse ir de encontro às preocupações daquele grupo de estudantes. Como corolário dessa inflexibilidade e aparente indisponibilidade das entidades competentes, os estudantes decidiram dirigir-se à Embaixada moçambicana a fim de poderem ser vistos e ouvidos, tendo tal gesto sido violentamente reprimido pela polícia argelina. Entretanto, os estudantes resolveram continuar lá acampados até que as suas reivindicações sejam satisfeitas. A manifesta repressão e indiferença por parte das autoridades moçambicanas parece ser mais um sinal de que em Moçambique não se pode manifestar a exigir um direito. Se pacificamente as autoridades não ouvem nem atendem aos seus cidadãos, o recurso às manifestações parece estar a institucionalizar-se como a única alternativa que resta, uma vez que estes não mais podem continuar a sofrer calados perante as injustiças que lhes são impostas.
Ademais, se o Governo moçambicano assume resolutamente que não tem dinheiro para custear condignamente as bolsas de estudo dos seus nacionais no estrangeiro, então que nunca se atribua bolsa alguma do género. Quem atribui bolsas deve pensar sempre em contingências. Os valores nunca devem ser tomados como estáticos. Eles devem ser considerados passíveis de reajustamento sempre que o custo de vida no país de acolhimento assim o exija.
Outrossim, a decisão de cancelar a bolsa e repatriar imediatamente os ‘cabecilhas’ da reclamação mostra que o Governo nunca esteve disposto a negociar com os estudantes. Essa decisão por si só cobre completamente os estudantes envolvidos de razão. Eles trouxeram matérias para discussão pacífica com o Governo, tendo este último se manifestado sempre inflexível. Nos últimos dias, fomos surpreendidos por informações segundo as quais o Governo tomou a decisão extrema de cancelar-lhes as bolsas e repatriá-los. Que Governo é esse que nunca negoceia ou nunca se envolve numa busca consensual de soluções com seus próprios cidadãos?
Se o direito de se manifestar é defendido pela Constituição da República, então não devíamos, de maneira alguma, aceitar que qualquer cidadão, por gozar do seu direito de se manifestar, perca automática e instantaneamente um dos principais que é o direito à educação. Queremos acreditar que estes estudantes que se levantam não se manifestariam se não antes tivessem tentado outras formas de mostrar as suas inquietações e se tais inquietações não fossem somente a satisfação de necessidades prementes derivadas da sua condição de estudantes. Acreditamos que, através da sua inflexibilidade, dureza e radicalismo desnecessários, o Ministro da Educação, Dr. Zeferino Martins, não vai querer ser responsável pelo fracasso, frustração e empobrecimento de mais jovens neste país.
Com efeito, e pelas razões acima supracitadas, nós, cidadãos moçambicanos, decidimos transformar as legítimas reivindicações dos estudantes nacionais na Argélia como um assunto de interesse nacional. Já testemunhamos reiteradamente casos de uso de dinheiros públicos para o financiamento de rubricas despesistas sem repercussão tangível na vida dos cidadãos moçambicanos comuns. Custa-nos acreditar que toda a estrutura do Estado moçambicano não tenha hoje fundos modestos para financiar com o mínimo de dignidade os estudos universitários dos seus nacionais (são apenas centena e meia de estudantes) que se estão a formar no exterior para depois virem ajudar a desenvolver efectivamente este país.
Salientamos igualmente que estamos todos dispostos a mostrar publicamente o nosso descontentamento perante a decisão arbitrária de repatriamento dos nossos compatriotas, se a postura ríspida e inflexível do Governo se perpetuar, e apelamos reiteradamente para que uma solução mutuamente vantajosa seja alcançada, de modo a que os estudantes moçambicanos na Argélia sem discriminação alguma não só vejam as suas bolsas reajustadas como também que possam todos eles prosseguir com os seus estudos naquele país. Assim sairemos todos a ganhar, como um país democrático que salvaguarda os interesses dos seus nacionais e que demonstra efectivo comprometimento para com a formação qualitativa do seu capital humano, de modo a contribuírem positivamente para o triunfo da agenda nacional de combate à pobreza.

Pela justiça dos estudantes moçambicanos na Argélia, a seguir subscrevemo-nos”

Subscrições

Até ontem, a carta já contava com centenas de subscrições colectadas através da rede social Facebook, e-mails e formato físico. (Redacção)


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