sexta-feira, 23 de março de 2018

Assim, são matumbos ou micheiros? Carlos Rosado de Carvalho





A actualidade económica nacional tem sido dominada por duas alegadas tentativas de burla envolvendo linhas de crédito internacionais para Angola.
A maior das duas linhas de crédito, no valor de 50 mil milhões USD, foi proposta pela Centennial Energy Thailand e destinava-se a financiar projectos de investidores nacionais e estrangeiros em sectores produtivos, nomeadamente agro-indústria, turismo, hotelaria, pescas e energia. Para o efeito foi assinado um memorando de entendimento com a Unidade Técnica Unidade Técnica para o Investimento Privado (UTIP).

CARLOS ROSADO DE CARVALHO
EXPANSÃO
23/03/2018


Da segunda, no valor de 30 mil milhões USD, pouco se sabe sobre o destino que seria dado ao dinheiro. As poucas informações disponíveis apenas dizem que esta linha de crédito, também sob a forma de um fundo, foi proposta ao Banco Nacional de Angola (BNA) por um consórcio entre a Resource Conversation e a Mais Financial Services, esta última alegadamente ligada a proeminentes figuras do "anterior" regime.
Contas feitas, os dois fundos colocariam à disposição de Angola 80 mil milhões USD.
Alguns exemplos ajudam-nos a compreender a enormidade dos montantes em causa.
Em 35 anos de relações diplomáticas, a China, que tem funcionado como uma espécie de banco de Angola, emprestou-nos apenas 60 mil milhões USD, de acordo com Cui Aimin, embaixador chinês em Angola.
Em 31 de Dezembro de 2017, o Estado angolano devia ao estrangeiro 38,1 mil milhões USD, valor correspondente à dívida externa governamental, segundo revelou o Ministério das Finanças em resposta a uma pergunta do Expansão.
Em 31 de Janeiro de 2018, o total de crédito concedido pelos bancos a operar em Angola ascendia a 3,8 biliões Kz, cerca de 18,3 mil milhões USD ao câmbio desse dia,
Quando a esmola é grande o pobre desconfia, diz o ditado popular.
Não foi o caso da UTIP e do BNA. Este último terá chegado mesmo a transferir 500 milhões USD para o consórcio intermediário.
Como é que a UTIP e o BNA caíram em tamanho jajão? Aparentemente quem estava à frente da UTIP e do BNA não tinha ideia nenhuma dos montantes envolvidos nas linhas de crédito. A isto chama-se Iliteracia financeira. Ou matumbice, como se diz na gíria.
É que se não foi matumbice, quem aparou o jogo dos supostos burlões sabia perfeitamente ao que ia e estava apenas interessado em ganhar umas michas das michas que os burlões iam cobrar.

Imagem: EXPANSÃO 461, de 23/02/18


quarta-feira, 21 de março de 2018

Corrigir duas coisas que estavam mal. Carlos Rosado de Carvalho





Não sei se foi prenda de aniversário - dia 20 de Fevereiro passaram-se 9 anos desde que saiu o primeiro número do Expansão -, mas, na última semana, duas questões pelas quais o jornal se vem batendo tiveram desenvolvimentos positivos. Refiro-me à criação das Autarquias e à facilitação da entrada de estrangeiros em Angola.

CARLOS ROSADO DE CARVALHO
Editorial
EXPANSÃO 461, 23/02/18

Começando por esta última, os cidadãos de mais cinco países deixam de precisar de visto, elevando para oito os países nestas condições, enquanto cidadãos de outros 61 países vêem facilitado o processo de autorização de entrada no País. Trata-se, sem dúvida, de um desenvolvimento positivo, mas é preciso ir mais longe do que facilitar as entradas. É preciso flexibilizar, com critério, naturalmente, a autorização de residência de estrangeiros. Durante o comunismo tínhamos cooperantes. Agora temos expatriados. Do que precisamos é de imigrantes. Estrangeiros que se fixem em Angola, que vivam como os angolanos, que possam trazer as suas famílias. Se dermos estabilidade aos estrangeiros que escolhem o País para trabalhar, estou certo que eles responderão aumentando o seu contributo. Naturalmente que ao abrir as fronteiras, ainda que com critério, repito, corremos o risco de deixar entrar gente menos desejável. Mas é a vida. Quanto às autarquias, além de serem um imperativo constitucional, infelizmente sempre adiado, sem que se perceba porquê, são uma condição necessária, embora não suficiente, para o desenvolvimento do país e o combate às assimetrias regionais. A criação das autarquias mais não é do que a criação de governos locais democraticamente eleitos. Por oposição ao que acontece actualmente, em que os municípios, distritos, comunas e bairros são geridos pelos primeiros secretários do MPLA que, com algumas excepções, poucas, estão lá mais para defender os seus interesses e os do seu partido do que os das populações. Na ausência de eleições locais as populações ‘votam com os pés’, abandonam as suas origens em busca de uma vida melhor no litoral em geral e em Luanda em particular. Com as autarquias, antes de ‘votarem com os pés’, os eleitores poderão mudar os governantes locais através do voto. Significa isso que os bairros, comunas, distritos e municípios passarão a ser governados ouvindo mais as populações sobre as decisões que lhes dizem respeito. Naturalmente que as autarquias não são uma panaceia para os problemas que afectam Angola. Mas que podem ajudar lá isso podem. E muito.

Imagem: Sérgio Piçarra, EXPANSÃO 460, 16/02/18

segunda-feira, 12 de março de 2018

Corrigir duas coisas que estavam mal. Carlos Rosado de Carvalho





Não sei se foi prenda de aniversário - dia 20 de Fevereiro passaram-se 9 anos desde que saiu o primeiro número do Expansão -, mas, na última semana, duas questões pelas quais o jornal se vem batendo tiveram desenvolvimentos positivos. Refiro-me à criação das Autarquias e à facilitação da entrada de estrangeiros em Angola.

CARLOS ROSADO DE CARVALHO
Editorial
EXPANSÃO 461, 23/02/18

Começando por esta última, os cidadãos de mais cinco países deixam de precisar de visto, elevando para oito os países nestas condições, enquanto cidadãos de outros 61 países vêem facilitado o processo de autorização de entrada no País. Trata-se, sem dúvida, de um desenvolvimento positivo, mas é preciso ir mais longe do que facilitar as entradas. É preciso flexibilizar, com critério, naturalmente, a autorização de residência de estrangeiros. Durante o comunismo tínhamos cooperantes. Agora temos expatriados. Do que precisamos é de imigrantes. Estrangeiros que se fixem em Angola, que vivam como os angolanos, que possam trazer as suas famílias. Se dermos estabilidade aos estrangeiros que escolhem o País para trabalhar, estou certo que eles responderão aumentando o seu contributo. Naturalmente que ao abrir as fronteiras, ainda que com critério, repito, corremos o risco de deixar entrar gente menos desejável. Mas é a vida. Quanto às autarquias, além de serem um imperativo constitucional, infelizmente sempre adiado, sem que se perceba porquê, são uma condição necessária, embora não suficiente, para o desenvolvimento do país e o combate às assimetrias regionais. A criação das autarquias mais não é do que a criação de governos locais democraticamente eleitos. Por oposição ao que acontece actualmente, em que os municípios, distritos, comunas e bairros são geridos pelos primeiros secretários do MPLA que, com algumas excepções, poucas, estão lá mais para defender os seus interesses e os do seu partido do que os das populações. Na ausência de eleições locais as populações ‘votam com os pés’, abandonam as suas origens em busca de uma vida melhor no litoral em geral e em Luanda em particular. Com as autarquias, antes de ‘votarem com os pés’, os eleitores poderão mudar os governantes locais através do voto. Significa isso que os bairros, comunas, distritos e municípios passarão a ser governados ouvindo mais as populações sobre as decisões que lhes dizem respeito. Naturalmente que as autarquias não são uma panaceia para os problemas que afectam Angola. Mas que podem ajudar lá isso podem. E muito.

Imagem: Sérgio Piçarra, EXPANSÃO 460, 16/02/18

sábado, 10 de março de 2018

AS PREVISÕES ECONÓMICAS. Alves da Rocha no Expansão.




A maior parte dos economistas tem uma queda pelas previsões económicas. Faz parte do seu ADN tentar perscrutar o futuro, para antecipar políticas e delinear estratégias. Hoje existe uma panóplia de instrumentos de previsão (e de projecção dos agregados económicos, se bem que exista uma diferença entre projectar e prever), desde os mais sofisticados, aos mais simples e directos. Uma característica comum a todos eles é que as previsões geralmente falham.

Alves da Rocha
LABORATÓRIO ECONÓMICO
EXPANSÃO 461, 23/02/18

O Fundo Monetário Internacional – que dispõe de um modelo complexo para apresentar as suas estimativas sobre o comportamento dos diferentes agregados
macroeconómicos dos vários países que integram esta organização internacional – modifica todos os meses as suas estimativas. É que, ainda que complexos, estes instrumentos não são completos, isto é, não conseguem abarcar as totalidades económicas – de cada economia e da economia-mundo – multifacetadas e sujeitas a alguns comportamentos imprevisíveis, veiculados pelos agentes económicos, que supostamente devem agir no respeito pelo postulado da racionalidade, mas que, por vezes, agem mais segundo atitudes de irracionalidade. As posições neoliberais sustentam muito a actuação racional dos agentes como o fundamento das escolhas e decisões de investimento privado, generalizando existir uma racionalidade da irracionalidade. Ou seja, ainda que nos pareça que determinados comportamentos dos agentes económicos sejam irracionais (a especulação e o açambarcamento podem ser duas delas e, muitas vezes, em Angola as entidades oficiais acusam os vendedores de responsáveis por uma parte da subida do índice geral dos preços, porque são especuladores), o que parece ser facto é que se aproveitam falhas de mercado ocasionadas por intervenções administrativas do Estado sobre os mecanismos de funcionamento dos mercados. Porém, os instrumentos de previsão não lidam bem com os procedimentos especulativos, porque saem de um determinado padrão de comportamento das variáveis económicas objecto de tratamentos estatístico-econométrico. E como tal – as previsões são feitas usando séries estatísticas longas que apresentem um padrão regular de comportamento da variável económica objecto de análise – a tarefa da predição torna-se mais arriscada e pode ser descredibilizada, sobretudo se as inconsistências e erros forem recorrentes, ou seja, repetidos em cada ciclo de previsão. Mas, apesar desta falibilidade, as previsões continuam a ser utilizadas.
Para os economistas e econometristas, os exercícios de previsão são também oportunidades de debate com base nas hipóteses assumidas. A estatuição de hipóteses é uma fase muito importante dos exercícios de previsão económica, dela dependendo a qualidade dos resultados finais das previsões: hipóteses descontextualizadas da realidade conduzem a resultados pouco fiáveis e mesmo rejeitáveis. Logo, a qualidade das políticas económicas sai desvalorizada. Os modelos são os instrumentos de previsão mais usados, havendo-os para praticamente todas as circunstâncias. Uma das classificações agrupa-os em modelos de previsão e modelos de decisão, sendo a diferença estabelecida na forma como são utilizadas as variáveis-instrumento e as variáveis-objectivo. Nos
modelos de previsão as incógnitas são as variáveis-objectivo (cujo valor se pretende que o modelo determine) e nos modelos de decisão, as variáveis-instrumento são as incógnitas, portanto a serem determinadas pelo modelo. São bem conhecidos os processos de construção dos modelos, sendo a recolha de informação e a escolha das variáveis e o estabelecimento de relações teóricas de relação entre variáveis-instrumento e variáveis--objectivo duas das mais importantes. A qualidade da informação, conforme referi antes, é uma matéria crucial, tanto nos seus aspectos quantitativos (séries estatísticas longas), quanto
qualitativos (consistência dessa informação que deve ser verificada e acautelada logo nas primeiras etapas do processo da sua elaboração). Normalmente, os modelos exigem a constituição de equipas multidisciplinares, competentes, com sensibilidade para os assuntos económico-sociais e apaixonadas por esta técnica
de programação económica. E claro que os modelos têm um custo financeiro. A Universidade Católica de Angola finalizou, em Outubro do ano passado, a construção do seu modelo macroeconómico, com o apoio de um competentíssimo grupo de macroeconomistas e econometristas do prestigiado centro de estudos norueguês Christien Michelsen Institute. Está a ser usado para diferentes estudos de previsão e de impacto das políticas económicas. É um
modelo complexo e o seu custo pode ser estimado, depois de 3 anos de trabalho (sobretudo devido às dificuldades de recolha de informação e de validação da sua fiabilidade), em cerca de 200 mil USD. Foi justamente esta questão dos custos que me levou a escrever este artigo sobre os modelos económicos, pois fiquei perplexo com o montante que o Fundo Soberano de Angola gastou pela construção do seu modelo. Nada mais, nada menos de 11,6 milhões USD. Isso mesmo, quase 12 milhões USD. Este modelo do Fundo Soberano tem de ser infalível, necessariamente, nas suas previsões económicas. O que é óptimo para o Governo, pois assim, a escolha, calibragem e quantificação dos objectivos e instrumentos sai no ponto. A empresa contratada pelo Fundo Soberano, como não podia deixar de ser, é estrangeira, a QG Investments, Ltd e, segundo informações que o Expansão me facultou, “é especializada em estudos de pesquisa e conta com uma equipa de analistas econométricos constituída, em 2013. Pelo Professor Kevin Urama, um ex-quadro das Nações Unidas e do Banco Mundial, que desempenha a função de conselheiro sénior do Presidente do Banco de Desenvolvimento Africano desde 2016”. Por outro lado, “O modelo em questão já está em funcionamento e as tarefas previstas no âmbito do contrato foram concluídas um mês antes do prazo estipulado. O modelo geral detém três níveis que consistem em submodelos de forma reduzida, submodelos estruturais e submodelos estocásticos de equilíbrio geral dinâmico. Este trabalho permitirá ao FSDEA fazer análises macroeconómicas e do impacto de políticas económicas, análise de cenários, gestão de risco económico e previsão de desempenho de portfólio e de decisões de investimento. O modelo econométrico foi desenvolvido sob coordenação de uma comissão multissectorial nomeada pelo Ministro do Planeamento e Desenvolvimento Territorial. A referida comissão foi composta por quadros seniores do Ministério do Planeamento e Desenvolvimento Territorial, do Ministério das Finanças, do Banco Nacional de Angola, do Instituto Nacional de Estatística e de várias empresas públicas, cuja missão foi de recolher os dados estatísticos oficiais históricos e periódicos dos indicadores económicos e de desempenho de sectores específicos, para garantir a fiabilidade das informações necessárias para os cálculos do modelo”. Portanto, as instituições do Estado, as referidas, mais algumas outras e as empresas públicas passam a dispor de um modelo de previsão económica que custou 11,6 milhões USD, havendo agora a garantia total de que o Executivo falará apenas de uma voz só, do acero das previsões e da correcção das políticas económicas definidas. A taxa de crescimento prevista para 2018, de 4,9%, foi este modelo que a forneceu? É que FMI, Banco Mundial, The Economist, OCDE, etc. (provavelmente usando modelos muito mais baratos), estimam-na em 1,6%. E então? Vai ser difícil para mim, enquanto cidadão que paga impostos, à custa dos quais o Fundo Soberano pagou 11,6 milhões USD pelo modelo, aceitar mais erros na escolha e definição das políticas
económicas nacionais.
Alves da Rocha escreve quinzenalmente
Imagem: Sérgio Piçarra Novo Jornal online 09/02/18

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

A desinflação competitiva. Alves da Rocha




A inflação voltou a ser um grave problema da economia nacional e os instrumentos clássicos disponíveis – taxa de câmbio e taxa de juro – podem ser conflituantes entre si e quanto aos objectivos de estabilidade dos preços e crescimento económico.

ALVES DA ROCHA
EXPANSÃO, 459, de 09/02/18

As margens de manobra são reduzidas, sobretudo devido ao desfavorável contexto macroeconómico geral, limitando o uso e o alcance da política orçamental como meio para incentivar o aumento do PIB (incremento de despesas reprodutivas, muito mais do que despesas produtivas, do lado da procura nominal ou redução de impostos do lado da oferta produtiva). A política cambial de desvalorização da moeda nacional tem (pelo menos até se encontrar o seu valor de equilíbrio) uma relação não amigável com a taxa de variação dos preços e não se sabe, em termos científicos e para as condições da economia nacional (desestruturada, incompetitiva, desarticulada, …) o “day after” , ou seja, conseguido o ponto de equilíbrio através de um trajecto penoso de perda sistemática do poder de compra da moeda e dos rendimentos internos, estar-se-á em condições de garantir, de facto, a estabilidade cambial? O mercado cambial interno é muito desequilibrado – praticamente um único agente ofertante, ainda por cima o Estado, sujeito sempre a influências e arranjos políticos e uma procura muito atomizada, de onde resultam comportamentos não totalmente compagináveis com as leis de mercado. Por outro lado, a economia angolana, desde pelo menos 2009 – ainda que com um ou dois episódios de crescimento do PIB acima de 4% - apresenta uma dinâmica de variação da produção na vizinhança de 2%, em termos de médias anuais. As estatísticas oficiais darem um incremento permanente, desde há muitos anos a esta parte, do volume de emprego (já referi que a economia angolana é talvez a única a criar novos postos de trabalho mesmo quando está em recessão, o que, na verdade, contraria os “dictates” da ciência económica). Apesar dessa evoluçaõ, o INE divulgou, recentemente, as suas estimativas sobre a taxa de desemprego no País, colocando-a no patamar de 20% (confirmando-se as estimativas que o CEIC anualmente apresenta no seu Relatório Económico e que, para 2016, apontavam para 21,5% da população economicamente activa). Ou seja e fechando o círculo de caracterização resumida mas essencial da economia nacional: alto desemprego, alta inflação e reduzido crescimento económico (não apenas em termos correntes, mas sobretudo em termos de produto potencial, relacionado com a capacidade de crescimento a longo prazo).
Como sair deste círculo, nas actuais condições financeiras difíceis? Para reflexão, anoto duas estratégias possíveis: a da desinflação competitiva e a do relançamento internacional (uma óptica keynesiana de economia aberta, podendo contribuir para o sucesso desta abordagem os resultados do aumento e da diversificação das exportações). A estratégia de desinflação competitiva apoia-se numa lógica teórica sólida, mas o seu alcance prático pode ser limitado perante o problema do desemprego (20% de taxa é muito e tem implicações significativas sobre a capacidade de crescimento futuro), essencialmente em virtude da lentidão dos mecanismos de ajustamento em que assenta. Que é necessário reduzir-se a inflação não há dúvida. A estratégia é que merece discussão. Michael Bruno (economista sénior do Banco Mundial, já falecido), estabeleceu, num estudo realizado com mais de 120 economias e um período de 25 anos, uma correlação entre taxas de crescimento do PIB por habitante e taxas
de inflação que o levou a concluir que para intervalos até 10% o incremento dos preços não prejudicava a dinâmica de variação do produto. A estratégia de desinflação da economia nacional que está a ser aplicada pelas autoridades governamentais parece assentar no rigor monetário e orçamental e na aplicação de uma política cambial de ajustamento progressivo do preço das divisas. Uma política monetária e orçamental restritiva provoca uma travagem da procura interna e uma forte subida do desemprego (a taxa de 20% anunciada pelo INE pode ainda não ser uma consequência directa da política de rigor monetário e orçamental, mas reflectir mais a existência de um desemprego estrutural que o funcionamento dos mecanismos de mercado, o fraco crescimento económico e as políticas de incentivo do investimento não têm conseguido superar). A travagem da procura interna está a induzir um ajustamento para baixo das importações ampliado pela desvalorização cambial, o que, em condições de controlo da inflação, pode consequencializar um incremento da competitividade de alguns produtos nacionais (oficialmente o termo usado é o de substituição competitiva das importações), convergindo-se na possibilidade de reabsorção de uma parte do défice externo. Porém, o controlo da inflação pode ficar afectado pelo processo de ajustamento cambial, atendendo à forte correlação entre as duas variáveis e não ser suficiente para conferir maior competitividade à produção nacional (o efeito desvalorização sobre as importações depende igualmente das respectivas elasticidades-preço dos diferentes ou de alguns produtos da pauta aduaneira). A questão central é a de se saber até onde deverá ir o processo de desvalorização cambial (será que o padrão de referência deve ser apenas a taxa de câmbio do mercado informal, ou, pelo contrário, deve ser estimada uma taxa de câmbio de equilíbrio baseada em outros critérios?) e o que fazer ao longo deste processo em termos de controlo dos preços, redução do desemprego e crescimento do PIB. Creio que já se percebeu que a actual política de restritividade monetária – com os efeitos sumariamente descritos – insere-se nas teses clássicas e monetaristas do “stop and go”. Ou seja, já se terá percebido que o País vai ter de lidar com um período de contracção do crescimento económico (incremento do desemprego, redução do poder de compra dos rendimentos e inflação a dois dígitos), não se compreendendo como o Governo aponta para 4,9% a taxa de crescimento do PIB em 2018 (as instituições internacionais preveem um valor menor, em redor de 1,6%). Um dos pressupostos desta estratégia é que o rigor monetário e orçamental conduzirá a uma nova situação de equilíbrio, com menos inflação, mais desemprego, maior equilíbrio externo e menos crescimento económico, sendo incerto que tal encadeamento possa ocorrer, de facto, na economia angolana. Como se parte, agora, para o “go”? A redução do défice externo e o recuo da inflação (em relação à dos nossos parceiros internacionais) contribuirão para a estabilidade da taxa de câmbio (maior competitividade externa) e a subida do desemprego provocará uma baixa dos salários reais (entretanto atenuada se for possível o controlo da inflação), duas situações facilitadoras de mais investimento, mais produção e eventualmente mais exportações. Ao aceitar-se, momentaneamente,
um nível elevado de desemprego, pode provocar-se uma baixa dos salários que melhore a competitividade da economia e a lucratividade das empresas, factores que no ciclo seguinte vão facilitar o relançamento da produção e do emprego (tanto mais rapidamente quanto o efeito competitividade dominar o efeito lucratividade). Será que é esta a estratégia do Governo? Que em alguns aspectos
existem semelhanças, isso é verdade, havendo a preocupação de se criarem condições para o incremento do investimento (nova Lei do Investimento Privado). No entanto, devo chamar a atenção para algumas limitações deste modelo de desinflação competitiva: a criação de desemprego é mais rápida do que o abaixamento dos salários reais (os empresários renitem em fazê-lo nomeadamente em relação aos melhores trabalhadores), a baixa de salários pode não reduzir o desemprego (havendo condições aumenta-se a produtividade) e sobreposição do efeito lucratividade sobre o da competitividade (os empresários, face a uma descida dos salários, aumentam os seus lucros mantendo os preços).
Alves da Rocha escreve quinzenalmente

Imagem: Sérgio Piçarra. Expansão, 459, 09/02/18

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Orçamento Geral do Estado 2018 não aborda como deveria a desigualdade. Alves da Rocha



A desigualdade é uma das grandes preocupações mundiais, tal tem sido a velocidade com que se agrava e aprofunda, deixando enormes faixas da população mundial em situação de pobreza, miséria e exclusão social. Existe um relevante grupo de economistas que se tem dedicado ao estudo da desigualdade no mundo e à identificação dos factores que mais relevantemente podem estar na sua origem. São identificadas (enumero sem comentários adicionais, que deverão aparecer nos próximos estudos do CEIC sobre esta importante matéria):

ALVES DA ROCHA
EXPANSÃO 457, 26/01/18

globalização, evolução tecnológica, crescimento dos serviços financeiros, alteração das normas salariais (atenção ao conteúdo da mais recente Lei do Trabalho em Angola), papel reduzido dos sindicatos e fraqueza das políticas de redistribuição fiscal dos governos (um mal de que a nossa política orçamental padece). Dentre os autores que mais recentemente se têm dedicado a esta tema destaco Thomas Piketty (o Capital no século XXI), Joseph Stiglitz (The Price of Inequality), Antony Atikinson (Desigualdade – O que Fazer), Fundo Monetário Internacional (Fiscal Policy and Income Distribution).
As desigualdades são tremendas em Angola (1) – pessoalmente não acredito que a mesma se expresse por um índice de Gini de 0,55 ou por um coeficiente de concentração de 20%-60%, ou seja,1/5 da população deter quase 2/3 do rendimento nacional, aguardando com enorme expectativa os resultados do novo inquérito às receitas e despesas familiares e formulando votos para que algumas das trapalhadas que ocorreram com o censo populacional se não repitam nesta grande pesquisa estatística – não sendo crível e possível atenuá-las no período de uma legislatura. Se mais razões não houvesse, os novos ciclos políticos e de governação são eles próprios geradores de distorções e desigualdades, porque a sobrevivência política de quem detém o poder de governar e decidir passa pela criação de grupos de apoio a todos os níveis, exigentes em distribuição de benesses e de privilégios. O balanço comparativo com os ciclos anteriores pode ser positivo (maior consideração pelos problemas sociais da população) ou negativo (cobertura das pretensões individuais e individualistas dos novos protagonistas). Sinceramente hesito em, a esta distância tão curta, pronunciar-me a favor de um balanço positivo da governação de João Lourenço neste item. A governação de José Eduardo dos Santos foi geradora de enormes desigualdades entre os cidadãos decorrentes de políticas sociais desequilibradas. Acrescendo-se a concentração de benefícios e de distribuição de rendimentos e riqueza na sua família parental e política. Na verdade, as riquezas concentraram-se nos grupos restritos próximos do Presidente e do exercício da função presidencial. Via de regra, espera-se que a governação seguinte melhore (muitas coisas, claro, mas neste item particular da desigualdade) os canais de redistribuição do rendimento, do acesso à riqueza e de criação de activos facilitadores da saída de uma parte da população da sua condição de pobreza, destacando-se a educação, a saúde e o acesso ao crédito (muito dificultado no País por razões estritamente económicas, umas, mas igualmente por burocracias e traficância de influências, só assim se explicando algumas fortunas constituídas na base do não reembolso de empréstimos solicitados ao sistema bancário angolano). O processo de transição política em curso ainda não está, do meu ponto de vista, completamente caracterizado. Para além do afã das demissões – outra hesitação da minha parte e relativamente a este aspecto leva-me a questionar se as cessações compulsivas de funções de quadros e responsáveis do aparelho do Estado (na sua acepção lata) nomeados pela Administração política anterior, tiveram como fundamento político essencial o desmantelamento dos lóbis constituídos e que eu esperava fossem mais poderosos (2) – ainda não se vislumbram sinais significativos de mudanças (para além das próprias demissões, não se tendo a certeza de que os substituintes sejam, política e tecnicamente, melhores que os substituídos). O Orçamento Geral do Estado (OGE), apesar do seu carácter de documento fundamental de política económica e financeira, não nos apresenta a “cartilha” fundamental através da qual se possa perceber o tempo e o modo do ataque à desigualdade no País. Ter-se-á de aguardar pelo Plano de Desenvolvimento de Médio Prazo 2018-2022 (gostaria de ser esclarecido se a sua elaboração foi ou não entregue a uma empresa estrangeira de consultoria). A desigualdade prevalecente em Angola é económica e social. E esta última é profunda e, mais grave, estrutural. O rompimento do seu círculo vicioso demanda por tempo. É tipicamente um círculo clássico dos países subdesenvolvidos e tão bem caracterizado, em tempos passados, por economistas como Raymond Barre, René Dumont, François Perroux, Mário Murteira, mais recentemente Simon Kuznets (3) e mesmo Anthony Atkinson ( já citado anteriormente). Trata-se, afinal, de uma reprodução alargada das condições de pobreza: em cada ciclo económico a pobreza não apenas se renova, mas amplia-se. Evidentemente que,
para que o kick off aconteça, tem de se estudar muito bem por onde começar, isto é, quais as políticas com maiores índices de eficácia e eficiência. A educação é uma delas, mas os seus efeitos positivos só aparecem a longo prazo, embora a médio termo se possam elencar alguns benefícios a favor do combate à pobreza
e atenuação da desigualdade. A melhoria da saúde pode desencadear efeitos a curto prazo sobre a produtividade do trabalho ao diminuir a incidência do absentismo e recuperar energias. Qualquer um destes sectores em Angola sofre de corrupção, desvio de fundos, desorganização, falta de qualidade dos serviços
prestados, sendo discutível afectarem-se crescentemente maiores volumes de despesas orçamentais enquanto se não reorganizarem os ministérios e respectivos departamentos e se não estripar a corrupção. Para mim, e sempre o afirmei, mais importante do que aumentar as verbas a si destinadas é melhorar a eficiência e eficácia na sua utilização. Tem-se depois a desigualdade económica, expressa pela diferença de rendimentos (trabalho qualificado/trabalho não qualificado, trabalho agrícola/trabalho industrial e no sector dos serviços, trabalho manual/trabalho intelectual), de acesso ao crédito bancário (ainda prevalecem situações em que o bilhete de identidade do MPLA abre e facilita as portas para a obtenção de empréstimos), de obtenção de facilidades de criação de negócios, etc. Daí que seja fundamental a despartidarização do Estado e das mentalidades. O MPLA tem de tomar a liderança deste processo porque é o responsável último pela criação de uma mentalidade partidária nas instituições públicas e privadas (desde o partido único e a organização administrativa da economia e da sociedade).
(1) Cálculos ligeiros e rápidos, baseados em metodologia clássicas, apontam, no caso angolano, para um incremento na taxa de crescimento da procura de 3% e do PIB de 4,5%, se 60% dos menos pobres transferissem 5% do seu rendimento para os mais pobres.
(2) É o velho problema das fidelidades e oportunismos políticos. Afinal os grandes defensores de José Eduardo dos Santos, das suas políticas e lideranças, são hoje os seus detractores principais, tendo abandonado o barco aos primeiros rompimentos do seu casco.

(3) É conhecida a curva de Kuznets (o célebre U invertido) que relaciona a desigualdade com o crescimento económico (medido através das taxas reais de variação do PIB por habitante) , concluindo-se que nas suas primeiras etapas a desigualdade aumenta, sendo necessário um valor significativo do rendimento médio para que a sua distribuição se faça mais equitativamente (em Angola e em 2017 o PIB por habitante foi de apenas USD 3500). Lembro que há uma diferença entre distribuição e redistribuição do rendimento nacional, sendo possível, com medidas fiscais (impostos e subsídios) actuar sobre esta mais rapidamente. Alves da Rocha escreve quinzenalmente.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Alguns receios para 2018. Alves da Rocha



Claro que Angola não entra bem em 2018. E não vale a pena continuar a pensar-se que a deterioração da sua situação global começou em 2014 e teve como causa mais relevante a queda do preço do barril do petróleo. O País sofre de problemas estruturais que vão exigir tempo, audácia, inteligência, trabalho, dedicação, astúcia e .... dinheiro (muito dinheiro), indisponível de momento.

15/01/2018
EXPANSÃO

E não serão necessários muitos documentos de política económica - desde que o novo presidente da República tomou posse já se podem contar pelo menos três, com o Orçamento Geral do Estado (OGE), estando na forja um quarto, o Plano de Médio Prazo 2018-2022 e um quinto, a Revisão da Estratégia de Longo Prazo. Muito documento desta natureza confunde os agentes económicos, torna complexa a manobra de coordenação e pode diminuir o impacto da implementação das diferentes medidas.
Normalmente, é mais difícil garantir a coerência e a consistência dos objectivos e dos instrumentos de política quando existem vários documentos, como é já o nosso caso. E estas características das políticas são essenciais para garantir a eficiência e a eficácia dos gastos do Estado e dos investimentos privados.
De acordo com as últimas estatísticas do INE sobre o comércio externo, o peso das exportações petrolíferas nas exportações totais baixou de 95% para menos de 75%, com as consequências normais sobre as receitas em divisas e sem que isso, na verdade, corresponda a sinais seguros e estruturantes de diversificação das exportações angolanas. Os diamantes continuam a ser o segundo produto de exportação.
Muito provavelmente, o novo regime cambial em vigor (corresponde a um sistema de desvalorização deslizante inteiramente a cargo do mercado) - que consequencializou já uma desvalorização de 8% face ao euro - não será suficiente para incentivar os investimentos privados destinados a produzir produtos de exportação. A conquista dos mercados externos exige um binómio preço/qualidade ainda bastante difícil de garantir nas actuais condições de exercício da actividade económica no país.
Por isso mesmo é que os especialistas nestas matérias de diversificação têm afirmado que se trata de um processo, para significar exactamente que o ambiente de negócios tem de ser corrigido e melhorado.
E um dos aspectos que tem inquinado a envolvente do investimento privado é a corrupção, cujo combate foi eleito como uma das grandes batalhas do Presidente João Lourenço. Embora ainda não se tenham aplicado novas e convincentes medidas tendentes a debelar este flagelo social e económico - a despeito de em todas as circunstâncias do seu aparecimento público o tema ser recorrente - é excelente que o mais alto magistrado da Nação insista neste aspecto, para pelo menos à partida desincentivar a ocorrência de práticas de desvio e roubo de dinheiros públicos da parte dos novos agentes públicos por si nomeados para fazerem parte do seu elenco governativo.
Como o próprio Presidente reconheceu, este combate exige coragem política e capacidade de aplicação das medidas que vierem a ser definidas como essenciais para se atacar este fenómeno. Haverá espaço político para isso? Qual o verdadeiro peso político de João Lourenço para levar a cabo este combate de uma maneira exitosa?
Sabe-se que os principais agentes e beneficiários da corrupção, desvio de fundos públicos, contracção de empréstimos bancários sem o respectivo reembolso e retorno (que possibilitasse que o conhecido multiplicador de crédito actuasse e beneficiasse mais empreendedores), utilização abusiva de bens públicos, traficância de interesses, etc., são do MPLA, que - é bom lembrar - exerce o poder de uma forma ininterrupta há 42 anos. Como envolvê-los nesta luta anti-corrupção?
Muitas fortunas que não emigraram para o exterior foram constituídas na base de     empréstimos bancários não reembolsados, junto dos bancos comerciais do Estado e cuja situação financeira caótica tem sido o Estado a colmatar com dinheiro dos contribuintes. Os malandros não são apenas quem, de um modo fraudulento, mas sempre com a conivência de altos responsáveis do regime, colocou dinheiro fora do país à custa do erário público. Também o são os que acabaram por criar património por vias ínvias, desonestas e fraudulentas no país.
Tudo tem de ter um começo e o trajecto seguido pelo Presidente João Lourenço tem de ser encomiado e apoiado (eu ando nesta luta há muitos anos e que me valeu o despedimento do Ministério do Planeamento devido a uma entrevista concedida ao Folha de São Paulo do Brasil, na qual denunciava a corrupção que grassava na Administração Pública).
Mas a corrupção não é o único obstáculo à criação de um ambiente de investimentos privados desinquinado e despoluído, indispensável para o crescimento e o desenvolvimento. A burocracia - via de regra associada à corrupção - é outro dos males a ser ferozmente combatido. Neste sentido, as mais recentes iniciativas do Governo - aumento para 50 milhões de dólares o montante de investimento privado sujeito à autorização do Presidente da República no quadro da Lei do Investimento Privado, aglutinação de alguns órgãos do Estado relacionados com o investimento privado (mais do que fusão de instituições dever-se-iam reduzir/eliminar procedimentos, formar/consciencializar os funcionários públicos), revisão da Lei do Fomento Florestal. Quanto mais reduzida se apresentar a cadeia de procedimentos, menores serão os custos administrativos, menor o espaço para a chamada corrupção de baixa intensidade e maior atractividade sobre as iniciativas privadas.
Compreende-se que se está a entrar numa nova era de governação - não de regime político, nem de autoritarismo do Estado/Partido - e, como se costuma dizer, elementos mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. Mas as mudanças podem ser feitas sem crispação entre os mais destacados agentes. Para mim, existe, sim senhor, crispação entre o Presidente da República e o Presidente do MPLA, não valendo a pena tentar-se tapar o sol com a peneira, pois o nível de compreensão e de leitura política da grande maioria da população é hoje muito diferente de há 10 ou 20 anos atrás.
A despeito do Presidente João Lourenço referir, em alguns dos seus pronunciamentos, que outros contratos entre o Estado e empresas privados têm de ser revistos, porque danosos para o erário público, o que é facto é que o processo se iniciou pela denúncia dos contratos envolvendo familiares directos do ex-Presidente a República, José Eduardo dos Santos. A serenidade dos ambientes políticos, a sua estabilidade e transparência, são igualmente elementos/características dos bons ambientes de negócios, tão fundamentais para a expressão da liberdade económica e liberdade de iniciativa privada. Eu receio que no decurso de 2018 o ambiente político se venha a deteriorar no interior do MPLA, presunção baseada no princípio da física segundo o qual "a toda a acção, corresponde sempre uma reacção".
A economia mundial está a atravessar um bom momento e seria danoso para Angola não se aproveitarem as oportunidades de crescimento (que envolve sempre incremento de importações) de países como os Estados Unidos, União Europeia, Brasil, Índia, Vietname, China e outros novos mercados de enormes potencialidades e que estão ávidos de novos acordos comerciais. A China é já um parceiro tradicional de Angola, embora os receios de um relacionamento aberto se avolumem um pouco por toda a África, dadas as apetências "imperialistas" deste gigante económico.
Cinco tentáculos parece caracterizarem o novo posicionamento deste país no mundo (depois de último Congresso do seu Partido Comunista): energias renováveis (este país acaba de construir o maior painel flutuante de energia solar do planeta e prepara-se pôr em prática um ambicioso plano de energias alternativas tendente a diminuir a poluição e reduzir a sua dependência energética dos fósseis, compra da América Latina e da África (resguardo de terras aráveis para garantir a sua segurança alimentar e o fornecimento de matérias-primas à manufactura), guardião do livre comércio (posição assumida na última cimeira mundial e perante a renúncia de assumir este papel da parte dos Estados Unidos), futebol (erguer-se como potência futebolística dentro de 50 anos) e grandes investimentos em rotas marítimas e terrestres (a nova rota da seda ou também chamada de economia circular).
Alves da Rocha escreve quinzenalmente



terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Milenium Angola não paga dólares transferidos do exterior





Luanda - A direcção do banco Millenium Angola decidiu não pagar em dólares a clientes cujos valores tenham sido movimentados por transferência externa.

Março 24, 2015
Manuel José
Fonte: VOA
CLUB K

Gerente diz que clientes podem ir queixar-se "onde quiserem"
A medida, que está a gerar uma onda de insatisfação sobretudo aos clientes que recebem salários por transferência a partir do exterior do país, começou a ser implementada este ano e visa, segundo o banco, salvaguardar outros clientes que depositam dinheiro físico.
A VOA passou por várias agências do Banco Millenium espalhadas pela capital e confirmou que só estão a pagar dólares a clientes tenham feito depósitos pessoalmente.
Para outros cujos valores em dólares foram movimentados por transferência, incluindo aqueles que recebem salários,a partir de empresas no estrangeiro, o banco diz não ter dólares.
"Isto é uma forma de matar o cidadão e sua família aos poucos porque não se consegue levantar o dinheiro, mas o dinheiro está lá, isto praticamente é um roubo, porque eu vou ao banco Millenium peçoo o extracto bancário dizem que tenho dinheiro então por que não me dão o meu dinheiro?”, interrogou um cliente ouvido pela VOA.
Outro cliente exige ao banco que decrete falência. "O banco Millenium poderia fazer sair um documento a decretar falência se não consegue atender transferências, só atende os que depositaram, é melhor decretar falência", disse.
Contactada, a gerente de uma das agências do banco Millenium adiantou que ser uma medida que a direcção do banco tomou e que os clientes podem ir queixa-se onde quiserem.

Imagem: autor desconhecido


domingo, 27 de agosto de 2017

UNITA. R e c l a m a ç ã o ao Plenário da Comissão Nacional Eleitoral CNE



A UNITA, representada pelo seu mandatário, Dr. Estevão José Pedro Kachiungo, nos termos do artigo 43.º nº1 e 3 da Lei 36/11 de 21 de Dezembro;
Vem, na sequência do Apuramento e divulgação dos resultados provisórios pela CNE, apresentar a sua, nos seguintes termos e fundamentos:
I
QUESTÃO PRÉVIAS
A UNITA apresentou no dia 24 de Agosto uma RECLAMAÇÃO junto da CNE, por seu mandatário junto daquela instituição, na sequência da divulgação dos primeiros resultados provisórios, que se considera aqui como totalmente reproduzida. Vide Doc.1
DOS FACTOS
I
A UNITA Constatou que os resultados divulgados pela CNE não têm como base as actas sínteses enviadas das Assembleias de Voto, porque elas não existem no Centro de Escrutínio em Talatona. Estes facto é confirmado pelos mandatários das candidaturas às Eleições de 23 de Agosto de 2017 colocados no Centro de Escrutínio em Talatona e pelos Comissários indicados pela UNITA e pela CASA-CE, Isaías Chitombi, Marcelina Pascoal e Dr. Miguel Francisco.
ADEMAIS,
III
Apesar de se terem fixado no ponto de recepção de faxes no Centro de Escrutínio em Talatona, não assistiram a chegada de nenhum fluxo de faxes com actas síntese das assembleias de voto que pudessem servir de base ao apuramento provisório anunciado pela Ilustre Comissária Júlia Ferreira.
V
CONSTATOU-SE AINDA,
A desmobilização do Centro de Escrutínio desde o dia 24/08/17, quando as três áreas que conformam o referido Centro de Escrutínio ficaram sem actividade por não receberem actas. Isto é, desde a PG, área da primeira gravação de actas, passando pela S.G. de segunda gravação, área de Codificação e a de monitorização de actas, até a de arquivos nenhuma delas funcionou, o que também pode ser provado pela constatação fáctica in loco.
VI
Os jovens recrutados e preparados para processarem 300 actas por dia apenas inseriram menos da metade, até a altura em que foram dispensados, por não funcionamento do sistema, o que pode ser igualmente provados com base na prova testemunhal dos próprios jovens. Estes jovens, foram dispensados por falta de actas sínteses para processarem, o que por si só demonstra que os resultados eleitorais provisórios ora anunciados, foram obtidos sem o lançamento de actas.
VII
DO DIREITO
I
Os resultados provisórios ao não terem como base as actas síntese enviadas das Assembleias de Voto, porque elas não existem no Centro de Escrutínio em Talatona, foi violado o disposto no artigo 124.º e seguintes da Lei 36/11 de 21 de Dezembro.
DO PEDIDO
1º-Nestes termos e nos demais da legislação aplicável se requer, que a CNE, cesse a divulgação dos resultados provisórios, até que sejam sanadas as irregularidades constatadas pelo recorrente.
3º- Que se abram os Centros Provinciais de Escrutínio nos termos do artigo 128.º da Lei 36/11 de 21 de Dezembro, aos mandatários das candidaturas para presenciarem o apuramento conforme lhes é permitido pelo artigo 118º da mesma lei, o que é indispensável para se aferir da transparência do acto;
Em alternativa,
2º -Que a Comissão Nacional que, hipoteticamente dispõe no Centro de Escrutínio de actas síntese arquivadas por Municípios e Províncias, se digne colocá-las à disposição do RECLAMANTE para que este as possa comparar in sitio na presença de todos os mandatários;
PELO QUE
E.D
JUNTA:
Arrola como testemunhas os seguintes senhores:
-Comissário Isaías Chitombi
-Comissária Márcia Pascual
-Comissário Miguel
-Comissário Jorge Mussonguela
-Comissário Cláudio Silva
Luanda, 27 de Agosto de 2017
O Mandatário
Dr. Estêvão José Pedro Cachiungo


CASA-CE. Declaração sobre o apuramento dos resultados eleitorais



COORDENAÇÃO GERAL DA CAMPANNHA ELEITORAL- COGECE

O Conselho Presidencial da CASA-CE vem acompanhando com minúcia a presente fase atribulada de “Apuramento de Resultados” e emite a seguinte Declaração:
A CASA-CE não reconhece a legalidade da proclamação dos “Resultados Provisórios” pela CNE, por ferir a legalidade orgânica e a transparência do processo, pelas seguintes razões:
Não obedeceu a tramitação legal de acordo com os artigos 123º, 129º, 130º, 131º e 132º que concedem a CNE o direito de publicar os resultados provisórios,  mas com base nas actas de apuramento das Comissões Provinciais Eleitorais, o que constituiu uma violação grave de procedimentos;
Não esteve baseada em informação fiável proveniente das províncias, desconhecendo-se a origem dos dados anunciados;
Não foi sustentada por escrutínio sob supervisão técnica dos Comissários Eleitorais encarregues para o efeito, reincidindo assim na ilegalidade orgânica;
Não foi assistido o respectivo escrutínio, a nenhum nível, pelos Mandatários das formações políticas concorrentes, nos ternos do artigo 118 da Lei Eleitoral, violando a transparência do processo.
Nesse sentido, a CASA-CE reserva-se ao direito de, em foro judicial, impugnar, por nulidade, a referida Proclamação de Resultados Provisórios.
A CASA-CE e os cidadãos em geral, no dia 24 de Agosto, tomaram conhecimento que a totalidade dos membros do CNE, indicados pelos Partidos da Oposição, em Conferência de Imprensa, demarcaram-se da Proclamação dos Resultados Provisórios, uma vez que foram marginalizados do processo a que supostamente conduziu à colecta de dados. Ao procederem assim, os Comissários confirmam a grave violação que o Presidente da CNE cometeu ao mandar publicitar, ao arrepio da lei e em desrespeito à orgânica da Instituição, um suposto Resultado Provisório, inclusive, com distribuição de mandatos, o que denuncia a clara intenção de dar um carácter definitivo a essa proclamação.

A CASA-CE tomou boa nota da decisão tomada na Reunião Plenária de Emergência da CNE, realizada a 25 de Agosto, que determinou o encerramento do mediático “Escrutínio Provisório” e o início do processo conducente a determinação dos Resultados Definitivos. Conforme a sobredita decisão, os escrutínios provinciais devem ser realizados com base nas Actas das Operações Eleitorais (das Mesas de Voto) em cumprimento da Lei.

A CASA-CE, constata com profunda preocupação que a directiva do Plenário da CNE, tarda em ser implementada, pois até as 9 horas de hoje, a situação era a seguinte:
As províncias do Cuando-Cubango, Cunene, Luanda, Lunda-Norte, Lunda-Sul, Malange e Moxico (7) não iniciaram sequer o escrutínio;
As Províncias de Benguela e Cabinda (2) têm o seu escrutínio suspenso pelos órgãos Eleitorais locais pelo facto de, em Benguela, se pretender apenas escrutinar os votos brancos e nulos e em Cabinda se pretender um escrutínio com base em actas síntese, em violação flagrante da lei em ambos os casos;
As províncias do Huambo e Huila (2) estão em fase embrionária de escrutínio, mas observa-se a existência de muitas urnas violadas.
As Províncias do Bengo, Bié, Cuanza-Norte, Cuanza-Sul, Namibe, Uíge e Zaire (7) estão a escrutinar com normalidade e segundo o padrão legal;
A CASA-CE adverte que apesar da Lei obrigar ao escrutínio provincial, logo após a recepção das primeiras actas, a decisão extemporânea para o início desse escrutínio, as imprecisões e ilegalidades dos órgãos eleitorais locais e a falta de integridade das urnas, podem perigar o prazo máximo de 7 dias, após o termo das eleições, concedido por Lei para concluir o processo de apuramento provincial. Exige, pois, que a nível central, sejam tomadas medidas excepcionais para concluir o processo, sem obstruir a Lei. Por conseguinte, a CASA-CE não vai aceitar que o processo decorra sem lisura, exigindo assim que, a todos os níveis, as instituições encarregues do escrutínio e apuramento exerçam a sua função no estricto cumprimento da lei e com a máxima responsabilidade.
A CASA-CE repudia as declarações que a Porta-Voz do órgão emitiu, segundo as quais tem havido provimento de informação e diálogo permanente com os partidos políticos. Não comenta, por seu lado, as declarações hostis, incendiárias e descabeladas, patentes na declaração política, de ontem, do partido da situação, na certeza de que estas não contribuem para um clima de serenidade e entendimento e cidadania que é aspiração comum do povo angolano.

A CASA-CE desqualifica as posições assumidas por alguns observadores internacionais que, de forma turística, visitaram esparsas mesas de voto, não se preocupando com o ambiente político geral, bem como, com a natureza global do processo eleitoral; fizeram tábua rasa às violações dos procedimentos legais que enformam o escrutínio provisório, consagrando precipitadamente uma força vitoriosa no esteio da posição musculada do partido da situação e evitaram, sintomaticamente, acompanhar o escrutínio definitivo, único que tem efectiva força mandatória.
A CASA-CE exalta a lição de cidadania do Povo angolano que exerceu o seu poder de soberania, com respeito às normas de civismo, na expectativa de que cada parte cumpra escrupulosamente com o seu dever, pelo que deplora o clima de manipulação e intimidação que pretende instalar o medo no espírito dos cidadãos, através de boatos sobre supostos actos de desordem protagonizados pelos membros dos partidos da oposição.
Exorta, por isso e com veemência, todos os cidadãos a manterem a serenidade, a vigilância e a firmeza, bem como a confiança no trabalho da CASA-CE, para que a Verdade Eleitoral seja defendida até ao fim. Desta vez, o país não pode aceitar, a adulteração da vontade dos eleitores.

Luanda, 27 de Agosto de 2017

O CONSELHO PRESIDENCIAL DA CASA-CE

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

A falta de decoro salarial. ALVES DA ROCHA



Vem isto a propósito da denúncia feita no semanário Expansão de 4 de Julho sobre os salários auferidos pelos Administradores e Membros do Conselho Fiscal do Fundo Soberano de Angola, instituição dotada de muito dinheiro proveniente do OGE e à custa dos impostos que cidadãos humildes e em grande dificuldade financeira pagam para que estes "senhores" possam viver "à la française" (ou "à la suisse").

ALVES DA ROCHA
EXPANSÃO

 Cada Administrador do FSDEA aufere mensalmente 43.600 USD e cada membro do Conselho Fiscal 23.900 USD (e parece que em moeda forte, delapidando-se as já de si frágeis reservas internacionais). Afinal em que País estamos? O Estado tem ou não tem dinheiro? Ou será que para umas coisas tem e para outras não. Neste momento de crise financeira e económica exige-se decoro e comprometimento com o povo, cuja maioria vive em condições sub-humanas.
O Fundo tem a responsabilidade, através de uma gestão competente, não danosa e eficiente entregar dividendos ao Estado, enquanto único accionista do Fundo. Mas, ao que parece, e ainda de acordo com o Expansão, em Setembro de 2016, os prejuízos acumulados foram estimados em 390,6 milhões USD. Uma empresa privada, se assim o entender e os seus ganhos de produtividade o permitirem, pode pagar este tipo de remuneração. Depende da política de desenvolvimento da empresa, definida pelos accionistas e aplicada pelo Conselho de Administração. O FSDEA é uma Instituição do Estado, utilizando dinheiro dos contribuintes e não pode, nem deve permitir-se a prática destas remunerações. Que tipo de trabalho justifica, afinal, uma remuneração de 43.600 USD por mês? E mesmo de 23.900 USD para um membro do Conselho Fiscal que reúne duas ou três vezes por ano? Será que no caso do Fundo Soberano o seu Conselho Fiscal desempenhou cabalmente as suas responsabilidades e tarefas? Parece que não, atendendo ao teor do artigo do Semanário Expansão.
Fazendo-se uma actualização a 2016 do montante médio mensal de remunerações do trabalho das Contas Nacionais (completas só até 2012), o salário médio mensal em Angola pode ser estimado em cerca de 60.000 AKZ, correspondentes a 300 USD. O que os Partidos Políticos têm a dizer sobre isto? Em especial o MPLA. Está-se perante uma diferença de 145 vezes. Não consegui encontrar no Programa de Governação do Partido do Poder qualquer referência ao problema das desigualdades de remuneração existentes nas Instituições do Estado e na economia em geral. Mas também os outros Partidos Políticos que podem ser Governo, a estas matérias dizem nada. A questão salarial no país não merece referência e consideração, com excepção dos 500 USD de salário mínimo nacional prometidos pela UNITA e que, do meu ponto de vista, e já o escrevi, não tem nenhuma viabilidade económica.
A questão salarial é de uma importância crucial para a redução das desigualdades sociais e económicas em Angola e devia ser abordada politicamente de uma forma responsável e científica pelos Partidos que pretendem governar o país. Pela via salarial e do emprego podem conseguir-se melhorias na redução das desigualdades sociais, bastando conseguir crescimento económico e equilibrar os ganhos de produtividade. Apesar de todos as propostas de Governação defenderem a diversificação como novo modelo de crescimento económico do país, são, no entanto, omissos quanto ao modo como criar uma massa crítica de procura nacional endógena viabilizadora da rendibilidade dos empreendimentos e dos investimentos que darão corpo à diversificação. E a substituição das importações - modelo muito apreciado por dirigentes políticos e empresários - igualmente é apelativa da criação de um poder de compra doméstico que consinta um mínimo de rendibilidade aos investimentos.
Outro dos grandes desafios para a próxima legislatura é o do emprego, ponto de partida para uma maior participação do factor trabalho do Rendimento Nacional. Digo bem, ponto de partida, porque o salário - dependente da produtividade e da repartição dos respectivos ganhos - é igualmente uma componente relevante para a garantia de uma melhor repartição do Rendimento Nacional. Mas, como já tenho escrito, muitas vezes e em diferentes circunstâncias, sem crescimento económico nada feito.
Também se sabe, através de inúmeras evidências empíricas, que pode acontecer crescimento económico com aumento de desemprego, tudo dependendo da intensidade tecnológica e capitalistística dos processos de produção e de fornecimento de serviços. A relação entre progresso técnico e emprego é complexa e antiga (desde os tempos da 1ª Revolução Industrial - introdução da máquina a vapor na indústria - e dos escritos de Karl Marx sobre a formação da mais-valia do trabalho), mas tem ganhado muita actualidade devido às permanentes inovações tecnológicas introduzidas nos vários sistemas de produção e corporizadas pela informática e robótica. No imediato, passa a haver substituição de trabalho por capital e os salários tendem a baixar, devido ao excesso de oferta. O que pode acontecer no futuro - longo prazo - ainda não se sabe muito bem: os empregos perdidos serão recuperados? O MPLA garante a criação de 500 mil novos empregos durante a próxima legislatura. A CASA-CE não promete nada a não ser a "promoção do emprego e o combate à precaridade" sem estimar qualquer cifra.
Tomem-se os 500.000 novos postos de trabalho. (Atenção: novos, o que significa que durante este período não ocorrerá nenhuma destruição de emprego). Como chegar a este número correlacionando produtividade (mais especificamente ganhos de produtividade) e crescimento do PIB? Só com uma taxa média anual de crescimento de 5% tal objectivo será viável, para ganhos médios anuais de produtividade de 2,5%.
No entanto, a maior parte das previsões de crescimento económico em Angola até 2021 apontam para uma taxa média anual de menos de 2% e do sector não petrolífero um pouco acima de 2%. Qualquer um dos valores é claramente insuficiente para patrocinar a melhoria do nível geral de vida da população, que cresce a uma taxa de 3,1% ao ano.
Mas temos de juntar a variável produtividade, para se chegar a uma estimativa mais realista da criação de emprego. A integração na Zona de Livre Comércio da SADC vai ser muito exigente em ganhos de produtividade, porque é a partir daqui que se pode adquirir músculo competitivo estrutural. Claro que também conta a competitividade institucional, empresarial, fiscal, das infraestruturas, etc., que é coisa que não se tem, nem as propostas de Governação dos Partidos dizem algo a propósito. Admitam-se ganhos de produtividade de 6,5% ao ano (ganhos de produtividade correspondem ao crescimento da produtividade bruta média aparente do factor trabalho). Nada de especial se olharmos para os casos da África do Sul, Namíbia, Botsuana, Tanzânia, Maurícias e fora do espaço sadciano o Quénia. Neste caso, para que o MPLA possa chegar ao fim da legislatura com 500000 novos empregos a economia terá de crescer a uma cadência média anual de cerca de 9%. Claro que não é impossível, desde que se removam obstáculos como a corrupção, a burocracia, o tráfico de influências, o ambiente de negócios e se consiga atrair muito investimento privado. E igualmente se passe para um modelo de crescimento mais baseado na redução das desigualdades, na redistribuição do rendimento e na promoção da inclusão social.
A taxa de desemprego formal em 2016 estimada pelo CEIC (Relatório Económico 2016) situa-se no intervalo 22%-24%, evidentemente muito alta e afastada dos propósitos de melhorar a distribuição do rendimento nacional.
As explicações para o desemprego fornecidas pela análise macroeconómica clássica e keynesiana são parciais, porquanto a experiência vai mostrando que mesmo com salários moderados e crescimento económico rápido, é sempre inevitável algum desemprego (por razões relacionadas com as imperfeições e diversidade dos mercados de trabalho). O mercado de trabalho é uma abstracção cómoda para efeitos de análise. Na realidade o que existe são diferentes segmentos do mercado de trabalho, podendo os desequilíbrios subsistirem simultaneamente em cada um deles: excesso de oferta nuns e excesso de procura noutros. No final, os "vasos comunicantes" da economia funcionam para se ter uma situação geral: excesso geral de oferta de trabalho - donde diminuição da taxa salarial - ou excesso geral de procura de trabalho, consequencializando aumento da remuneração deste factor de produção. O desemprego provocado pela segmentação do mercado (de trabalho) tem origem e natureza diferente do desemprego clássico e keynesiano.
Com este artigo ponho ponto final às minhas incursões políticas pelas propostas de Governação dos Partidos Políticos. E neste momento já decidi qual a orientação do meu voto no dia 23 de Agosto.


RNA de embustes e descaso para com os contribuintes



A emissora do Wako Kungo e o site nacional entraram em “inexplicável afonia”
A relação do poder político com os cidadãos em Angola é consabidamente pautada pelo descaso de quem decide em relação àqueles que num passado não muito distante chamava garbosamente de “massas populares”.

CORREIO ANGOLENSE

O Poder desrespeita reiteradas vezes os cidadãos e sequer se dá ao trabalho de justificar as suas tomadas de decisões ou actos administrativos. Um exemplo disso mesmo aconteceu na última semana de Julho, quando foi inaugurada a Rádio Waku Kungo, uma das muitas emissoras que o grupo RNA tem estado a instalar país afora nos últimos tempos. A esse esforço, como se sabe, não estão alheias as eleições que se realizam no dia 23 próximo. Afinal, e como é legítimo, mesmo tendo colocado o país nos últimos lugares dos diversos rankings mundiais, o governo do MPLA quer continuar no poder!
Com pompa e circunstância, a 28 de Julho último o ministro da Comunicação Social, José Luís de Matos, inaugurou a nova estação “no âmbito da expansão do sinal da rádio em todo o território nacional”. No acto estiveram presentes o governador da província do Kwanza-Sul, altos funcionários do Ministério da Comunicação Social, PCA da TPA e administradores da Angop e Edições Novembro, autoridades tradicionais e religiosas.
Como acontece nessas circunstâncias, a barulheira foi ensurdecedoramente fastidiosa, os noticiários das rádios e televisão estatais ocuparam largos minutos com a “notícia”, dando ênfase ao “excelente” trabalho do Executivo e à “clarividência” do “camarada presidente”. Como acontece em momentos de verdadeira “euforia revolucionária” como estes, seguiu-se um regabofe para celebrar o “grande feito”, uma vez que o sinal acabado de inaugurar era também ouvido – pelo menos teoricamente – nos confinantes municípios de Kasonge, Kibala e Ebo.
Seguramente, quando o ministro e a sua delegação deixaram a cidade que já se chamou Santa Comba Dão fizeram-no com o sentimento de dever cumprido. O que o dignitário e seus acompanhantes não sabiam é que foram vítimas de um embuste, uma vez que pouco depois de darem as costas, a emissão da rádio chamada “comunitária” foi abaixo. Ou seja, simplesmente saiu do ar e deixou de ser ouvida durante largos dias.
Ao que o Correio Angolense apurou no local, a “queda” do sinal não se deveu a problemas de natureza técnica, como se podia inicialmente pensar, uma vez que é comum nas esferas do Poder comprar-se gato por lebre. Tinha única e exclusivamente a ver com falta de combustível nos geradores que abastecem a emissora. É que, para a inauguração do “edifício moderno, do ponto de vista tecnológico e muito avançado, que comporta dois estúdios, redacção, um gabinete e uma central técnica”, como informou a agência estatal ANGOP, um benfeitor local havia oferecido alguns litros de combustível no valor de AKZ 100.000,00 só para o acto, “para inglês ver”... Ou seja, só para a inauguração.
Por isso, pelo menos até quase finais da semana passada a Rádio Waku Kungo continuava “muda” e à espera de um cheque de um milhão de kwanzas proveniente da direcção da RNA para aquisição de combustível a fim de devolver a “voz” à mais nova “filha” do grupo RNA pelo menos até ao dia 23 deste mês, data da realização das eleições. O que não se sabe é se um qualquer “chefe” não precisará de alguns litros lá para casa e o combustível sequer chegue para aguentar a emissora até ao “dia D”.
Estranho em tudo isso é o facto de, sendo o grupo RNA supostamente dirigido por gente com alguma formação, ter sido ignorado uma importante fonte de geração de energia eléctrica como as placas solares. É que, além de tudo, são limpas, funcionais e no longo prazo infinitamente mais baratas! Ou a instalação de geradores obedeceu à “tradição do cabritismo”, o mesmo que dizer da “comissão”?
Em matéria de embustes, porém, a RNA não se fica por aqui, havendo outro exemplo flagrante que todos fingem não ver. Trata-se do propalado site www.rna.ao, inactivo há já quase um ano, embora a emissora tenha um redacção específica para a plataforma, cujos trabalhadores continuam a receber os seus ordenados sem... trabalhar! Visto doutra forma, os contribuintes andam a pagar a vadios!
Mais estranho ainda neste caso particular, é ouvir os locutores dos principais serviços noticiosos da RNA remeterem os ouvintes para o site da emissora. “Para mais informações, consulte as notícias em www.rna.ao”, anuncia eufórico quase diariamente a voz de António Muaxilela após o noticiário da 20h00. Será que ele e outros na RNA não sabem que o site virou embuste?
Brincadeira tem hora, meus senhores!